Mercado tira folga da eleição
O noticiário eleitoral faz uma pausa nesta quinta-feira, em meio à ausência de divulgação de novas pesquisas sobre a intenção de voto, o que abre espaço para acompanhar a agenda econômica. Faltando 10 dias para as eleições, o mercado financeiro brasileiro está cada vez mais convencido de que haverá um segundo turno entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad, sendo que no embate final dificilmente o PT voltará ao poder.
Com isso, os investidores reduzem a postura defensiva e já não esperam mais um “pior cenário” após o pleito de outubro, zerando as apostas que haviam montado em busca de proteção. Esse movimento permitiu, por exemplo, que o dólar tocasse brevemente os R$ 4,00 na sessão de ontem e que a Bovespa voltasse a flertar com o nível dos 80 mil pontos.
Mas a disputa de segundo turno segue extremamente competitiva e incerta. Há quem diga, inclusive, que o embate final se trata de uma “nova eleição”, colocando em evidência os dois rivais - para o bem ou para o mal. Assim, a decisão do vitorioso pode se dar apenas nos acréscimos do jogo eleitoral e é prematuro tentar acertar o resultado final um mês antes.
É bom lembrar que o mercado financeiro já incorreu em erros semelhantes no passado, quando tentou acertar decisões políticas que levam em conta a soberania popular. Nas eleições de 2014 no Brasil, muitos tinham a certeza da vitória de Marina Silva, principalmente após o trágico acidente envolvendo Eduardo Campos.
Nos EUA, Donald Trump era dado como carta fora do baralho e, na votação do Brexit, ninguém acreditava que o Reino Unido escolheria pela saída da União Europeia (UE). Portanto, um otimismo dos negócios locais com uma possível vitória do candidato do PSL e uma agenda liberal em um eventual governo Bolsonaro em 2019 é, no mínimo, arriscado.
Seja como for, os investidores acreditam que, independentemente de quem ocupar o Palácio do Planalto a partir de janeiro do ano que vem, será impossível escapar de um ajuste fiscal e das reformas estruturais, de modo a evitar que o país quebre. Contudo, ainda é incerta a intenção do presidente eleito de colocar essa agenda econômica em prática e, principalmente, a capacidade de execução e diálogo com o Congresso Nacional, que também será renovado.
Enquanto o veredicto final das urnas não é conhecido, os investidores se voltam, então, para a agenda econômica do dia e a quinta-feira começa agitada, com a divulgação do relatório de inflação do Banco Central referente ao terceiro trimestre deste ano, às 8h. No documento, a autoridade monetária deve mostrar ligeira piora para as expectativas de alta dos preços (IPCA), do dólar e do crescimento econômico (PIB).
Nessa balança, o BC deve corroborar a aposta do mercado financeiro brasileiro, de alta moderada, de 0,25 ponto, na taxa básica de juros já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que acontece dias após o segundo turno das eleições. O resultado final nas urnas, porém, continua sendo o principal balizador para o início desse processo de aperto.
O presidente do BC, Ilan Goldfajn, concede entrevista coletiva às 11h e pode falar da influência do jogo eleitoral na condução da Selic. Por estar muito perto da divulgação da ata da reunião de setembro, na última terça-feira, será importante acompanhar a fala do comandante da autoridade monetária, em busca de novas pistas sobre os próximos passos.
Também às 8h, a FGV informa os dados de setembro do IGP-M, que deve vir bem salgado. O salto em relação a agosto deve ser ao redor de 1,5%, com a taxa acumulada em 12 meses encostando-se em 10%. O indicador, é bom lembrar, é usado para reajustar boa parte dos contratos de aluguéis comerciais e residenciais.
Ainda no mesmo horário, sai também a leitura final da confiança da indústria neste mês. Depois, às 9h, é a vez do índice de preços ao produtor (IPP) em agosto. No exterior, sai o índice de sentimento econômico na zona do euro em setembro, logo cedo. No fim do dia, a China informa a leitura final do índice de atividade neste mês.
Já o calendário econômico norte-americano traz os pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos nos Estados Unidos e a terceira e última leitura do PIB do país no segundo trimestre deste ano, ambos às 9h30. Ainda no mesmo horário, têm as encomendas de bens duráveis em agosto. Também serão conhecidos dados de agosto sobre as vendas pendentes de imóveis residenciais (11h).
No fim da tarde (17h30), o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, discursa. Mas ele deve simplesmente repetir o que falou ontem, durante entrevista coletiva após a decisão de elevar a taxa de juros dos EUA para a faixa entre 2,00% e 2,25%, seguindo sem esclarecer o paradigma econômico em que se baseia o plano de voo da autoridade monetária.
Afinal, para as teorias tradicionais não faz muito sentido prever um crescimento econômico robusto do país no curto prazo combinado com um cenário de pleno emprego, mas sem gerar pressões inflacionárias. Da mesma forma, é paradoxal retirar a postura “acomodatícia” na condução da política monetária e reduzir a previsão de alta da taxa de juros até 2020.
Aparentemente, o Fed dá a entender que ocorreram “mudanças sensíveis” nos paradigmas macroeconômicos, o que permite inovar na resposta, de modo a não prejudicar a dinâmica da economia norte-americana. Ao mesmo tempo, a autoridade monetária sinaliza que o processo de aperto dos juros veio para ficar - o que não deixou feliz o presidente Donald Trump e torna mais ambígua a linguagem em relação à orientação (guidance) futura.
Nesta manhã, os investidores digerem o cenário do Fed sobre o custo do empréstimo nos EUA no médio prazo e fazem uma releitura da mensagem deixada ontem. As principais bolsas europeias iniciam a sessão no vermelho, com as perdas lideradas por bancos e mineradoras, após uma sessão de queda na Ásia e em meio ao sinal negativo em Wall Street.
Entre as moedas, o euro recua em meio à turbulência política na Itália, diante da possibilidade de o governo adiar a divulgação do orçamento para 2019. Com isso, o dólar se fortalece em relação às demais moedas rivais, apoiado também pelo cenário de juros mais altos nos EUA nos próximos dois anos. Já o petróleo segue nos maiores níveis em quatro anos, enquanto o cobre recua.