Mercado busca uma saída
As fortes perdas em Wall Street ontem castigam o pregão europeu nesta manhã, após uma sessão no vermelho na Ásia. A escalada da tensão geopolítica entre China e Estados Unidos, que agora acusam Pequim de tentar roubar informações sobre vacina contra o coronavírus, eleva a cautela entre os investidores, que ficaram assustados com a perspectiva sombria do Federal Reserve para a economia norte-americana.
E se o ambiente lá fora não está favorável à tomada de risco, o cenário local tampouco beneficia o mercado doméstico. O inquérito que investiga acusação de interferência política na Polícia Federal colocou o presidente Jair Bolsonaro em contradição, considerando-se as versões dos ministros palacianos. Aliás, termina hoje o prazo para a Corte Suprema (STF) decidir sobre a divulgação do vídeo da reunião ministerial, indicado por Sergio Moro.
Em outra frente, o Congresso aprovou o projeto que permite o reajuste salarial das polícias Civil, Penal e Militar do Distrito Federal, bem como o Corpo de Bombeiros. A proposta custará R$ 505 milhões aos cofres públicos e abre brecha para que outras unidades da federação pleiteiem o mesmo, ampliando os riscos fiscais do país e colocando em xeque à agenda de austeridade e de reformas da equipe econômica do ministro Paulo Guedes.
Ou seja, nem aqui, nem lá, o investidor tem para onde fugir. Por isso, a busca por proteção em ativos físicos (e não financeiros), como o dólar, tem sido crescente. Ontem, a moeda norte-americana renovou o maior valor (nominal) em relação ao real pela segunda vez seguida, indo a R$ 5,90. Na máxima do dia, o dólar chegou a bater R$ 5,95, confirmando a premissa de que a conquista da faixa de R$ 6,00 é apenas uma questão de tempo.
Ao mesmo tempo, o investidor - local, principalmente - segurou o Ibovespa ligeiramente abaixo dos 80 mil pontos, alheio à queda de até 2% em Wall Street e à recomposição de prêmios em toda a estrutura a termo da curva de juros futuros. Mas ficou a sensação de que algo estava fora do lugar. Afinal, se o prêmio de risco no país subiu, o que justifica o desempenho quase que positivo da Bolsa brasileira?
Cai na real
No exterior, o mercado parece começar a se dar conta de que os preços das ações estão supervalorizados e não condizem com o cenário ainda indefinido para a economia global pós-pandemia. Foi preciso o presidente do Fed, Jerome Powell, alertar que a ideia de que a recuperação econômica após o fim dos bloqueios (lockdown) será rápida é uma fantasia para que os investidores percebessem que a retomada vai levar algum tempo.
Além disso, apesar do achatamento da curva de contágio em vários países, permanece o risco de uma segunda onda de infecções do coronavírus, o que aumenta o pessimismo de que a vida vai voltar ao “normal” em breve. Com isso, as pessoas tendem a reduzir o consumo, mostrando-se mais propensas a poupar os recursos, o que, por sua vez, aumenta os riscos de liquidez das empresas, podendo levar a uma crise de solvência.
Esse temor, somado à relação sino-americana cada vez menos amistosa, pressiona as bolsas europeias nesta manhã, com queda de quase 2%, após Tóquio (-1,7%) e Hong Kong (-1,5%) lideraram as baixas na sessão asiática. Xangai caiu menos de 1%, com os investidores monitorando a acusação de autoridades norte-americanas, de que hackers chineses estavam tentando roubar dados sobre tratamentos e vacinas de coronavírus.
Já os índices futuros das bolsas de Nova York flutuam, alternando altas e baixas, à espera da atualização dos pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos nos EUA, que já rondam a marca de 30 milhões de solicitações no acumulado de quatro semanas. Nos demais ativos, o juro projetado pelo título norte-americano de 10 anos (T-note) está perto de 0,6%, ao passo que o dólar mede forças frente as moedas rivais, mas o petróleo avança.
China em destaque
A agenda econômica doméstica perde força, trazendo apenas dados regionais da produção industrial em março (9h), o que desloca as atenções para a safra de balanços. O destaque fica com o resultado financeiro da Petrobras nos três primeiros meses deste ano, após o fechamento do pregão.
Já no exterior, merecem atenção os pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos nos EUA, às 9h30. No mesmo horário, saem os preços de importação e de exportação no país em abril. No fim do dia, a China anuncia dados do mês passado sobre a atividade na indústria e no varejo, além dos investimentos em ativos fixos.