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Exterior tem rali, mas aqui a crise avança


O mercado financeiro inicia a segunda-feira tentando se desviar do quadro geral de forte tensão e grande volatilidade que marcou a semana passada, apoiando-se na diminuição de novos casos de coronavírus na Europa e na confiança em relação à recuperação econômica nos Estados Unidos. Esse sentimento sustenta o sinal positivo entre os ativos de risco no exterior.


Resta saber se os negócios locais terão forças para acompanhar essa sinalização para o dia vinda lá de fora, em meio à escalada da crise política no governo. O depoimento do empresário Paulo Marinho, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, criou novos contornos à investigação que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) e complica as acusações de interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal.


Segundo o outrora aliado do presidente, Flávio Bolsonaro, de quem é suplente no Senado Federal, teria o procurado após o segundo turno das eleições presidenciais de 2018 para informar que teve conhecimento prévio sobre a operação da PF que investigava a prática de “rachadinha” entre deputados da Assembleia do Rio de Janeiro. A fala de Marinho abre um novo rol de investigação e pode endossar o depoimento do ex-ministro Sergio Moro.


Tanto que a Procuradoria-Geral da República (PGR) já mandou ouvir o empresário. Além disso, deputados federais da oposição, em sua maioria do PSOL, entraram com representação no STF para que o inquérito seja ampliado. Ainda hoje, o ministro Celso de Mello deve decidir sobre a divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, citada por Moro, como prova da pressão de Bolsonaro.


Em meio à tensão política, é importante observar se o Ibovespa conseguirá romper para cima a faixa dos 80 mil pontos, ou irá sucumbir abaixo da marca de 75 mil pontos, intensificando a velocidade da queda, bem como se o dólar irá flertar mais uma vez a faixa dos R$ 6,00, que só não foi alcançada por causa de uma atuação fora dos padrões do Banco Central. Já os juros futuros incorporam prêmios de risco em toda a curva a termo.


Lá fora, tudo bem


Esse ambiente doméstico mais turbulento se contrasta com as águas tranquilas por onde navegam os investidores no exterior. Por lá, a reabertura das principais economias nos dois lados do Atlântico Norte e a possibilidade de uma segunda onda de contágio de Covid-19 deixaram de ser uma preocupação. A sensação, agora, é de que o pior ficou para trás e já é possível ser mais otimista em relação ao cenário à frente.


O tom positivo na fala do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, sustenta esse sentimento. Em entrevista ontem, no programa “60 Minutes”, da CBS, Powell expressou confiança na recuperação econômica dos EUA, mas ressaltou que a retomada pode “demorar um pouco”, arrastando-se até o fim de 2021 ou até se descobrir uma vacina. Porém, ele salientou que não se deve “apostar contra” a economia dos EUA.


Com isso, os índices futuros das bolsas de Nova York exibem ganhos acelerados, de quase 2%, o que embala a abertura do pregão europeu, após uma sessão de alta mais moderada na Ásia. O avanço do barril do petróleo tipo WTI para o maior nível em dois meses, já na faixa de US$ 30, também dá ritmo aos negócios. Já o dólar perde terreno para a divisas correlacionadas às commodities, enquanto o juro projetado pelo título de 10 anos dos EUA (T-note) cai.


Os ativos norte-americanos também digerem a fala de Powell, de que o Fed tem munição suficiente para combater a recessão causada pelas paralisações na atividade, por causa das medidas relacionadas ao coronavírus. Ainda assim, ele previu tempos difíceis à frente, avaliando que a economia dos EUA pode ficar 30% menor no segundo trimestre deste ano e a taxa de desemprego pode subir a 25%. Ou seja, pode ser preciso fazer mais do que o esforço já feito pelos bancos centrais para dirimir os impactos da pandemia.


Com isso, não se pode descartar que os ativos de risco apresentem mudanças bruscas de sinais durante a sessão e ao longo dos próximos dias, pois enquanto a confiança das pessoas na livre circulação não voltar ou ocorrer um tratamento eficaz ou vacina para a doença, a volatilidade tende a reinar. Aqui no Brasil, o quadro é ainda pior, com a politização do vírus em torno do trade off entre saúde e emprego elevando a tensão em Brasília, enquanto os indicadores econômicos são cada vez mais fracos e as finanças públicas, mais desequilibradas.


China em destaque na agenda


A agenda econômica perde força nesta semana, em termos de divulgação de indicadores relevantes, o que desloca as atenções para eventos envolvendo autoridades dos EUA e da China. Amanhã e quinta-feira, o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, têm compromissos oficiais, no qual pode dar pistas sobre a recuperação da economia norte-americana no cenário pós-coronavírus e as várias possibilidades - “V”, “W”, “U” ou “L”.


Aliás, a fala de Powell ontem, no programa de TV, ecoa a retórica insistente do chefe da nação, Donald Trump, e parece ter endereço certo, em meio à escalada da tensão sino-americana. Afinal, sabe-se que Trump está tentando convencer os eleitores da importância de lutar contra a China para vencer o pleito em novembro.


Por isso, é importante saber qual é a resposta da China, que não deve se distrair com as travessuras políticas da Casa Branca e tende a manter o foco estratégico. Com isso, merece atenção o Congresso Nacional do Povo (NCP), que começa na sexta-feira. Um dia antes, tem início o Congresso Consultivo Político do Povo Chinês (CPPCC). Juntas, essas reuniões, conhecidas como as “Duas Sessões”, contam com a presença de líderes e representantes do Partido Comunista Chinês (CCP), bem como da sociedade civil, para traçar os objetivos de médio e longo prazos.


O encontro deve servir de base para o 14º Plano Quinquenal da China, que vigora entre 2021 e 2025, período em que o país já espera uma situação global mais hostil. Mas enquanto a segunda maior economia do mundo antevê um mundo globalizado de forma radicalmente diferente (decoupling), é preciso saber o que as lideranças chinesas irão fazer para se adaptar a esse cenário e continuar prosperando, em direção às metas para 2049.


Ainda não se sabe, por exemplo, se será definida uma meta numérica de crescimento econômico para este ano. Nos três primeiros meses de 2020, sob forte impacto do surto de coronavírus, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês caiu 6,8% em relação aos últimos três meses de 2019, na primeira queda desde que o dados trimestrais começaram a ser publicados. Em termos anuais, o recuo foi de 9,8%, o primeiro desde 1976.


Mas mais importante que um número é saber quais setores serão apontados como prioritários para a continuidade do desenvolvimento econômico e social chinês. Ainda mais agora, que os EUA bloquearam o fornecimento de tecnologia essencial para a Huawei, em um momento em que a China investe em inovação, conectando 5G, Inteligência Artificial (AI) e Big Data para explorar o potencial da informação e da comunicação, construindo ecossistemas industriais e impulsionando o progresso.


Até então, os dados de abril sinalizam uma recuperação em “V” da indústria, mas indicam que a demanda doméstica segue retraída, em meio ao aumento do desemprego por causa da pandemia e aos temores da população de uma segunda onda de contágio. Além disso, a demanda externa também será afetada, com a disseminação do coronavírus no mundo.


Já os investimentos em ativos fixos priorizaram a propriedade e a infraestrutura, em detrimento ao crédito, o que resultou na falência de pequenas empresas e em uma postura menos generosa de injeção de liquidez por parte do Banco Central chinês (PBoC). Diante disso, ganha relevância o discurso do primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, na abertura do Congresso Nacional do Povo, na sexta-feira.


Nele, Li deve apresentar os principais esforços da China para combater o coronavírus, que surgiu no fim de 2019 na chinesa de Wuhan e saiu em cerca de 70 dias de um rígido bloqueio (lockdown), e realçar a importância de o país se tornar mais autossuficiente, concentrando-se no vasto mercado consumidor chinês e na inovação tecnológica. Ao final do evento, daqui a uma semana, é esperada uma coletiva de Li à imprensa internacional.


Confira a seguir os principais destaques desta semana, dia a dia:

*Horários de Brasília


Segunda-feira: A semana começa com a agenda econômica fraca, trazendo, no Brasil, o primeiro IGP do mês, o IGP-10 (8h), além das tradicionais publicações domésticas do dia, a saber, o boletim Focus do Banco Central (8h25) e os dados semanais da balança comercial (15h). No exterior, destaque apenas para números do setor imobiliário nos EUA.


Terça-feira: A agenda de indicadores econômicos segue fraca, o que desloca as atenções para o testemunho do presidente do Fed, Jerome Powell, no Senado dos EUA. Novos dados do setor imobiliário norte-americano serão conhecidos, enquanto a zona do euro informa o índice ZEW de sentimento econômico.


Quarta-feira: O calendário econômico traz como destaque a ata da última reunião de política monetária do Fed, em abril. Também serão conhecidos os dados semanais sobre o fluxo cambial no Brasil e os estoques de petróleo nos EUA, além da inflação ao consumidor (CPI) na zona do euro.


Quinta-feira: A agenda econômica doméstica traz apenas a prévia da sondagem da indústria em maio. Já no exterior, merecem atenção dados preliminares de maio sobre a atividade nos setores industrial e de serviços nos EUA e na zona do euro, além dos pedidos semanais de auxílio-desemprego no país. Entre os eventos de relevo, Powell, do Fed, participa de um seminário sobre a Covid-19.


Sexta-feira: A semana chega ao fim trazendo como destaque o início dos eventos políticos mais importantes na China - a sessão plenária do Congresso Nacional do Povo (NPC) e a sessão anual do Comitê Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CPPCC), também conhecidos como as “Duas Sessões”, que deve trazer medidas mais concretas do Partido Comunista Chinês (CCP) após o controle da disseminação de coronavírus no país. As discussões nas “Duas Sessões” devem durar uma semana.


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