Mercados em alerta
A blindagem dos investidores a um cenário iminente de aumento da taxa de juros norte-americana, após a fala da presidente do Federal Reserve, Janet Yellen, na última sexta-feira, mostra menor resistência à escalada da tensão geopolítica na Ásia. Os quatro mísseis lançados pela Coreia do Norte em retaliação aos exercícios militares do país vizinho junto aos Estados Unidos servem de motivo para certa realização de lucros no exterior.
Os índices futuros das bolsas de Nova York estão em queda nesta manhã, assim como as principais bolsas europeias, e o dólar recupera terreno ante os rivais, mas cai em relação ao iene, ao passo que o petróleo recua e os metais básicos também, diante do segundo lançamento de mísseis pela Coreia do Norte em menos de um mês. Ainda assim, os mercados lá fora não devem reagir a este fato ao longo do dia, a menos que a situação fique mais tensa.
Por enquanto, o não cumprimento da resolução da ONU pelo país comunista serve apenas de gatilho para embolsar os ganhos recentes, principalmente após a mensagem deixada por Yellen. Para ela, pode ser "provavelmente apropriado" subir os juros nos EUA neste mês e o processo de normalização da taxa "não será tão lento quanto foi nos últimos anos".
Após esse recado claro, o mercado vai colocar suas cartas no relatório de emprego norte-americano (payroll), que sai na sexta-feira e pode ser um divisor de águas para os negócios globais - caso nenhuma surpresa aconteça. Ainda assim, os investidores depositam suas fichas nas promessas do presidente dos EUA, Donald Trump.
Afinal, contanto que o custo do empréstimo nos EUA suba a doses suaves de 0,25 ponto, mas o republicano entregue sua agenda "fenomenal" de impostos mais baixos, desregulamentação e gastos em infraestrutura em tempo hábil, não haverá problema para tomar risco. Esse otimismo depende também de uma aceleração do crescimento da maior economia do mundo.
Já a segunda maior economia do mundo estabeleceu uma meta de crescimento para 2017 de "cerca de 6,5%, ou mais, se possível", em meio à realização do Congresso Nacional do Partido Comunista, que acontece até a semana que vem. Em um relatório apresentado no evento, o primeiro-ministro Li Keqiang reiterou ainda a busca de uma política monetária neutra este ano.
Na Europa, a ansiedade aumenta a cerca de dois meses da disputa presidencial na França, mas as atenções da semana se voltam para os próximos passos do Banco Central da zona do euro (BCE), que decide sobre a taxa de juros na região da moeda única na quinta-feira. Após a inflação ao consumidor (CPI) ter atingido 2% no mês passado, o presidente do BCE, Mario Draghi, pode ser pressionado em interromper os estímulos que vem injetando na economia.
Os sinais de volta da inflação nas economias desenvolvidas tende a encerrar o longo período de taxas de juros negativas, o que tende a atrair recursos aplicados em outros países, como o Brasil. Mas essa questão deve ficar em segundo plano nos mercados domésticos diante da bateria de indicadores relevantes programados para a semana.
Entre amanhã e sexta-feira, o IBGE divulga seus maios importantes indicadores econômicos, reforçando a percepção de que “no Brasil, o ano só começa depois do Carnaval”. Serão dias que dificilmente poderão ser classificados de tranquilos para os negócios locais.
Hoje, o calendário doméstico traz dados da atividade (PMI) em fevereiro (10h), além das tradicionais publicações do dia - boletim Focus (8h25) e balança comercial semanal (15h). No EUA, saem as encomendas às fábricas em janeiro (12h). Amanhã, é a vez de nada menos que o Produto Interno Bruto (PIB) e o desempenho da economia doméstica teve ter continuado em queda no último trimestre de 2016.
A questão é saber quanto o PIB caiu ao final do ano passado e quão será o contágio negativo para a atividade no início deste ano. Assim, por mais que o discurso da equipe econômica tente convencer que já existem sinais de estabilização da economia, os números ainda não mostram isso. Nesse sentido, os dados da produção industrial (quarta-feira) em janeiro podem mostrar qual era o ritmo da atividade logo no início de 2017.
Apenas a melhora da inflação tem sido convincente e o resultado do índice oficial de preços ao consumidor brasileiro (IPCA), na sexta-feira, deve corroborar esse cenário. De qualquer forma, a combinação de inflação em queda e atividade fraca ainda permitem ao Banco Central dar continuidade ao ciclo de cortes na taxa básica de juros (Selic).
Tudo isso sem contar com eventuais notícias advindas da esfera política, na esteira de delações premiadas que podem vir à tona. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve pedir nos próximos dias ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquérito para investigar ministros do governo Temer, além de senadores do PMDB e do PSDB, todos citados por ex-executivos da Odebrecht, o que pode minar as chances das reformas no Congresso.
Entre eles, estariam na lista os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil), Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) e Gilberto Kassab (Ciência e Tecnologia e Comunicações). Da bancada do partido no Congresso, devem ser investigados o presidente do Senado, Eunício Oliveira; o líder do PMDB e ex-presidente da Casa, Renan Calheiros, e os senadores Edison Lobão e Romero Jucá. Integram também a lista da Procuradoria os tucanos José Serra e Aécio Neves.