Protesto verde e amarelo acende alerta vermelho
A tentativa da classe política de estancar a sangria da Lava Jato através de alterações no pacote anticorrupção encontrou dificuldades não só por parte do Judiciário. Ontem, milhares de manifestantes foram às ruas em centenas de cidades em vários Estados do país em apoio à Operação da Polícia Federal, que terá novos episódios nesta semana, com o início da delação premiada da Odebrecht. E é nesse ambiente sensível que o presidente Michel Temer pretende encaminhar a polêmica Reforma da Previdência.
Temer não chegou a ser alvo das manifestações ocorridas no domingo, que não se transformaram em um "Fora Temer" e miraram nos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Renan Calheiros. Porém, o Palácio do Planalto não tem o que comemorar e sabe que precisa apoiar o Congresso para dar continuidade ao ajuste fiscal.
Mas, é preciso repetir: se Temer optar por apoiar manter o apoio aos parlamentares no embate entre Legislativo e Judiciário, pode sofrer um desgaste maior junto à opinião pública; se resolver distanciar-se dos projetos polêmicos, corre o risco de não conseguir aprovar as medidas. Nessa situação em que todos precisam estar unidos, há uma ameaça de afundarem juntos.
Até porque os investidores - estrangeiros, principalmente - já começam a questionar aquela ideia de que os ruídos políticos são indiferentes, desde que as reformas continuem avançando. O principal fator de preocupação para os "gringos" é o depoimento de executivos da Odebrecht à força-tarefa da Lava Jato, que começa nesta semana e deve ser danoso ao governo Temer.
Há meses a elite política em Brasília teme a colaboração dos executivos da maior construtora do país e com a turbulência se aproximando da capital federal, o cenário político deve continuar ditando o rumo dos mercados domésticos. Nesse cenário, de pouco adianta falar do conteúdo das notas do Comitê de Política Monetária (Copom), amanhã, e dos números da inflação ao consumidor brasileiro (IPCA), na sexta-feira.
Afinal, o que a agenda econômica doméstica reserva reflete aquilo que é visto pelo retrovisor e, aos negócios, só interessam as cenas dos próximos capítulos da novela política. O mesmo se pode dizer em relação ao ambiente internacional.
A vitória do "Não" no referendo da Itália deixa a Europa em alerta vermelho. O primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, sofreu derrota humilhante, de 60% a 40%, na consulta popular sobre o plano para uma grande reforma constitucional e anunciou que renunciará ao cargo. A derrota coloca o país e a zona do euro em uma situação difícil.
Mas o cenário poderia ser mais complicado caso o candidato de extrema-direita, Norbert Hofer, não tivesse sido derrotado nas urnas na eleição na Áustria. Os eleitores austríacos optaram pelo professor de economia, Alexander Van der Bellen, como seu próximo presidente. Ainda assim, as eleições do ano que vem na Holanda, França, Alemanha e, agora, na Itália tendem a manter o euro pressionado.
A instabilidade política no velho continente pode agravar as dificuldades econômicas e do sistema financeiro da zona do euro, colocando o Banco Central Europeu (BCE) em pânico. Aliás, a reunião do BCE está entre os destaques do calendário de indicadores e eventos econômicos no exterior.
A autoridade monetária da região da moeda única volta a se reunir na quinta-feira e o presidente Mario Draghi será questionado por esses fatores políticos que podem colocar o euro novamente à beira do colapso. À isso, soma-se ainda o Brexit no Reino Unido e a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos.
Em meio a esses fatores, o euro cai cerca de 1% ante o dólar, ao passo que a libra esterlina recua 0,3%. Nos bônus, o custo do empréstimo nos títulos italianos deu um salto, com o rendimento (yield) de 10 anos subindo a 2% e contaminando os papéis de outros países da região da moeda única. Já a T-note de 10 anos cai, devolvendo parte do avanço na sexta-feira passado após os dados de emprego nos EUA.
Nas bolsas, as ações de bancos lideram as perdas na Europa, com os índices nas praças de Paris, Frankfurt e Londres exibindo uma queda acentuada e ignorando a tentativa de alta ensaiada pelos índices futuros em Nova York. Na Ásia, a Bolsa de Xangai conduziu o sinal negativo, com -1,2%, após Trump rejeitar as críticas à decisão de conversar por telefone com a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen. O yuan chinês caiu pela primeira vez em três dias.
Como se pode notar, a primeira semana inteira de dezembro deve ser bastante “animada”, diante da potencial influência que o noticiário político pode ter sobre a dinâmica de preços dos ativos globais. Assim, pode perder um pouco de brilho os dados de atividade e de inflação a serem conhecidos nos próximos dias, tanto no fronte doméstico quanto no plano internacional, com a cena política se sobrepondo aos assuntos econômicos.