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A plebe rude


A principal ladainha dos últimos dias girou em torno da inclusão do nome do ex-presidente Lula nas pesquisas de intenção de voto com vistas às eleições presidenciais de outubro – e sua consequente e crescente liderança na preferência do eleitorado. A chiadeira incluiu candidatos envergonhados com a própria incapacidade de cativar os eleitores com suas propostas; comentaristas conservadores que não sabem mais como bater em Lula sem que isso gere um efeito massa de pão; e a parte do eleitorado cegada pelo ódio alimentado por décadas de um impiedoso massacre midiático.


Nos cassinos financeiros, o real derreteu frente ao dólar como é típico dos períodos eleitorais, conforme previmos que aconteceria logo na segunda edição da coluna Overdose. O pensamento dos players do mercado é de que “no dólar eu sou amigo do rei”.


Comecemos então com um esclarecimento: iniciado o período de campanha, os institutos de pesquisa são obrigados por lei a incluir em suas sondagens formais os nomes de todos os candidatos registrados na Justiça Eleitoral (TSE). E os institutos de pesquisa, ainda que vivamos em tempos de guerra aberta dos donos do poder contra a vontade popular, já têm cada um seus problemas de metodologia para comprometerem ainda mais a própria credibilidade com violações mesquinhas da lei eleitoral.


Se para uma parte a pergunta é “por que tratam um presidiário como candidato?”, para a outra é “por que o candidato líder nas pesquisas está preso?”


O fetiche pela prisão de Lula consumado a poucos meses das eleições pouco fez além de reforçar a impressão de que todo o circo político-midiático-judicial em torno do julgamento não tinha nenhum outro objetivo além de impedir o retorno do ex-presidente ou do Partido dos Trabalhadores ao Palácio do Planalto. E isso não pode ser considerado exatamente uma surpresa.


Tivesse o juiz Sérgio Moro mantido a situação em banho-maria e talvez – frise-se o talvez – a situação atual fosse outra. Mesmo em campanha, Lula certamente teria mais dificuldade para emplacar a percepção de que é um preso político. Mas a ordem de prisão baseada em uma sentença marcada por escassez de provas e excesso de convicções, o atropelamento da ordem de soltura e agora a liminar do Alto-Comissariado de Direitos Humanos da ONU exigindo do Estado brasileiro que preserve o direito de Lula fazer campanha, mesmo preso, reforçou a percepção – no Brasil e no mundo – de que Lula é de fato um prisioneiro político.


A ideia, com a prisão, era negar a Lula a possibilidade de sair em campanha, limitar sua capacidade de fazer sua mensagem chegar aos eleitores, mantendo-o numa espécie de limbo no qual em pouco tempo seria esquecido. Mas aconteceu justamente o contrário.


Para seus detratores, Lula virou um espectro a assombrá-los. Para seus apoiadores, Lula tornou-se um mito, o verdadeiro mito. Também não era nada muito difícil de se prever, mas a prisão tornou o ex-presidente um adversário muito mais difícil de ser enfrentado do que já o era como candidato de carne e osso.


Por mais que Lula seja escondido ao máximo nos noticiários, por mais que Fernando Haddad não seja chamado para os debates, por mais que seus atos de campanha como vice sejam solenemente ignorados pela mídia, Lula cresce nas intenções de voto e inscreve em pedra o que seus correligionários já diziam meses atrás: eleição sem Lula é fraude.


Estivesse o Brasil numa situação de normalidade democrática, o projeto de centro-esquerda de Lula seria confrontado nas urnas e provavelmente levaria à quinta eleição presidencial consecutiva – talvez em primeiro turno –, para desespero dos conservadores, privatistas e adoradores da Igreja do Deus Mercado do Sétimo Dígito. Mas não é o caso.


E o desespero é à toa. A lapidar frase de Romero Jucá significa isso mesmo. Vai ser realmente inesperado se a liminar da ONU for cumprida, ou se o TSE decidir-se em favor do direito de Lula de ser candidato.


O problema é que o Caju e toda aquela turma da lista da Odebrecht combinaram “com o Supremo, com tudo”, menos com a plebe. E olhe que nem estamos lidando com nenhuma espécie de “interferência russa”, mas sim com o povo, aquele demos que compõe a palavra democracia, mas que impavidamente se recusa a passar pela máquina de moer do pessoal do “grande acordo nacional” e mantém viva a esperança de um futuro melhor.


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