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Mercado entre brasileirismo e externalidades


Riscos fiscais e inflacionários no Brasil reduzem ímpeto do mercado doméstico, mas otimismo no exterior com vacina anti-Covid e estímulo nos EUA ofusca incertezas locais


O comportamento lateral do mercado doméstico ontem serviu para lembrar, se é que alguém tinha dúvida, que os riscos fiscais e inflacionários não foram dissipados. Ainda que os investidores (locais) subestimem a turbulência política à frente, os leves ganhos do Ibovespa e do dólar na véspera mostram que embora não haja disposição para uma realização de lucros mais acentuada, tampouco há apetite por ativos arriscados.

Com isso, as movimentações em Brasília em torno da questão fiscal tendem a deixar o mercado apreensivo, diante dos renovados relatos de que o governo estaria tentando, mais uma vez, “furar” o “teto dos gastos”, em meio aos anseios por um novo programa social. A disputa em aberto pela presidência das Casas Legislativas, em fevereiro, é um fator adicional de instabilidade. Sem falar que nada deve ser discutido no Congresso até lá.

Adicione aí também a politização em torno da vacina anti-Covid. Toda essa incerteza política pode prejudicar os negócios locais de seguir o otimismo externo, a não ser que os “gringos” continuem encontrando por aqui um prato cheio para saciar a fome por risco. Afinal, quem já é escaldado em Brasil sabe que é improvável que o Executivo anuncie medidas impopulares, como o fim do auxílio emergencial e, quiçá, a compra da “vachina”.

A grama do vizinho

Lá fora, o início da vacinação contra a covid-19 na Europa e a iminência de um pacote bilionário de estímulos a ser lançado pela Casa Branca sustenta os mercados, relegando o aumento de casos da doença nos Estados Unidos para 15 milhões. Os futuros das bolsas de Nova York amanheceram em alta, depois de um dia de novos recordes, reagindo à proposta de US$ 916 bilhões apresentada pelo secretário do Tesouro, Steven Mnuchin.

A notícia embalou o pregão na Ásia e sustenta a abertura do pregão europeu no azul. A exceção fica com a Bolsa de Xangai, que caiu 1,1%, em meio às renovadas tensões geopolíticas entre Estados Unidos e China. Os investidores também digerem a inesperada queda do índice de preços ao consumidor chinês (CPI), em -0,5% em novembro, em base anual, refletindo a deflação nos alimentos. A previsão era de estabilidade (0%).

Já os preços ao produtor chinês (PPI) reduziram a queda de 2,1% registrada em outubro para -1,5% no mês passado, ficando, assim, acima da previsão de -1,8%. Enquanto os preços no varejo refletem o fim da escassez da carne suína, que vinha pressionando a inflação ao consumidor, a deflação menor no atacado mostra que a atividade na China continua se recuperando, com a demanda elevando os preços de bens industriais.

Em reação aos números, o yuan chinês superou a barreira de 6,50 por dólar pela primeira vez desde 2018 e a perspectiva é de que o renminbi siga em trajetória de valorização, diante do fortalecimento da economia local, com rápida recuperação da atividade e expansão da demanda doméstica. Por sua vez, a libra esterlina segue vulnerável às tratativas envolvendo Reino Unido e União Europeia sobre o Brexit. O petróleo avança.

Dia de decisão

A decisão de juros do Comitê de Política Monetária (Copom) é o destaque do dia, mas o anúncio só será feito após o fechamento do pregão local, a partir das 18h30. É unânime a expectativa de manutenção da Selic em 2%, pela terceira vez seguida. Mais do que a decisão em si, as atenções estarão voltadas ao comunicado do Banco Central.

Diante da crescente ameaça fiscal e do acúmulo de pressão inflacionária, espera-se que a autoridade monetária mude o tom do discurso, adequando a linguagem à realidade, diante do desejo do governo em criar um programa de renda mínima, desviando as despesas do “teto dos gastos”, e da ausência de sinais de alívio na alta dos preços.

O que o mercado espera ouvir do BC é até quando será possível segurar a taxa básica de juros no piso histórico, com a inflação corrente em níveis superiores à meta perseguida para este e o próximo ano, o rombo nas contas públicas cada vez mais profundo e o crescimento econômico em ritmo aquém do esperado.

Entre os indicadores econômicos, saem dados preliminares deste mês do IGP-M (8h) e do fluxo cambial (14h30) e números regionais sobre a inflação ao consumidor (IPC-S) no início de dezembro, logo cedo, e a produção industrial em outubro (9h). Lá fora, às 12h têm o relatório Jolts sobre as contratações e demissões nos EUA e os estoques no atacado, ambos referentes a outubro, além dos estoques semanais de petróleo (12h30).

*Aviso: a partir de 14/12/2020, A Bula do Mercado será semanal, publicada apenas às segundas-feiras. Em 11/01/2021, os textos voltam a ser diários.


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