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Mercado monitora riscos




Os riscos políticos no Brasil e nos Estados Unidos e o temor de uma segunda onda de contágio de coronavírus continuam no radar do mercado financeiro. Os investidores avaliam a chance de o caso Fabrício Queiroz respingar no presidente Jair Bolsonaro, ao mesmo tempo em que digerem a retomada da campanha eleitoral de Donald Trump e mostram preocupação com a reversão das medidas de reabertura das economias em meio ao ressurgimento de casos de Covid-19, contra a qual pode não haver imunidade.


Mas a colossal liquidez global injetada pelos bancos centrais e os estímulos fiscais lançados por governos de vários países, que somam quase US$ 20 trilhões neste ano (21% do PIB global), tendem a se sobrepor a qualquer outro aspecto no mercado financeiro, o que sustenta os ativos de risco. Tanto que os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram em alta, apagando as perdas exibidas ontem à noite.


Essa sinalização positiva para o dia em Wall Street se dá apesar da pandemia ganhar velocidade nos EUA, com 12 estados norte-americanos batendo recorde de novos casos. Os locais mais graves são Flórida, Texas e Arizona, que registram entre 3,5 mil e 4 mil novos casos de Covid-19 todos os dias. Ontem, a Organização Mundial da Saúde (OMS) relatou recorde no aumento de casos diários de coronavírus, liderado por Brasil e EUA.


Na Europa, a taxa de reprodução do novo coronavírus na Alemanha subiu para 2,88 ontem, de 1,79 no dia anterior, mostrando que as infecções no país estão subindo acima do nível necessário para manter a pandemia sob controle. O aumento reflete um surto na região da Renânia do Norte-Vestfália, depois que mais de mil funcionários de uma empresa de processamento de carnes testaram positivo para a doença.


Com isso, as principais bolsas europeias não conseguem replicar o sinal positivo visto do outro lado do Atlântico Norte e exibem perdas moderadas, atentas também à crise de fraude contábil enfrentada pela fintech alemã de pagamentos Wirecard. Na semana passada, a empresa admitiu ter “perdido” quase 2 bilhões de euros e agora está negociando com credores sobre linhas de crédito.


Portanto, o cenário corporativo também está mais sombrio e requer cautela. Na última sexta-feira, a decisão da Apple de fechar 11 lojas em quatro estados dos EUA onde a doença teve reincidência pesou em Nova York. Durante o fim de semana, a China suspendeu a importação de produtos da Tyson Foods, onde centenas de trabalhadores testaram positivo para a Covid-19. A notícia atrapalhou o pregão na Ásia hoje.


Ainda assim, não se observa uma busca desenfreada por proteção em ativos seguros. Ao contrário, o dólar tem queda acelerada em relação às moedas rivais e correlacionadas às commodities, mas o petróleo está de lado, rondando a marca de US$ 40 por barril. Já o ouro se aproxima do maior nível desde 2012, próximo a US$ 1.750 a onça-troy.


Ou seja, não se pode descartar que alguma volatilidade se apresente nos negócios, embora insuficiente para interromper um movimento positivo dos ativos de risco. Não se trata, porém, de um rali estelar, tal qual visto nos últimos dois meses, nem uma queda livre, conforme observada em março.


Política em foco


O noticiário político no Brasil e nos EUA entra de vez no radar do mercado financeiro, após a prisão de Fabrício Queiroz, homem de confiança da família Bolsonaro, e em meio à retomada da campanha presidencial de Donald Trump pela reeleição. O foco dos investidores está nos eventuais desdobramentos, que traz uma incerteza ao ambiente.


Por aqui, a preocupação é com os chamados “riscos de cauda”. Um aumento da probabilidade de impeachment do presidente, uma escalada da tensão entre os Três Poderes, um fracasso na articulação do governo com o Centrão e a perda de apoio popular são vetores que podem provocar uma reação mais acentuada e negativa dos ativos locais.


Por ora, essas incertezas políticas estão mais refletidas na curva a termo de juros futuros, que segue com uma inclinação (“steeping”) muita alta, com as taxas mais longas em níveis mais elevados. O comportamento também reflete dúvidas quanto à rota de reformas econômicas e ajuste fiscal, de modo a evitar uma dinâmica ruim na relação dívida/PIB.


Aliás, atento a isso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, estuda criar uma nova regra fiscal - a quarta - que se soma à meta de superávit primário, à regra de ouro e ao teto de gasto. A proposta seria criar uma meta para a dívida pública, sendo que o gatilho para essa âncora do endividamento seria a venda de estatais e das reservas internacionais.


A ideia da equipe de Guedes é sinalizar ao mercado financeiro que o governo segue empenhado com o ajuste fiscal, apesar dos gastos extraordinários por causa da pandemia. Com isso, o ministro continua sinalizando aos investidores o compromisso com uma política econômica ortodoxa, ainda que isso possa agravar a situação econômica do país.


Já nos EUA, o comício promovido pelo Partido Republicano em Tulsa (Oklahoma) para marcar a retomada da campanha de Trump pela reeleição atraiu menos apoiadores que o esperado, após boicote organizado pelo TikTok, e foi ofuscado por críticas à resposta do presidente à pandemia e aos protestos nacionais contra a violência policial.


Foi o primeiro evento em três meses e ocorreu às vésperas da publicação do livro do ex-conselheiro de segurança nacional John Bolton, cuja íntegra do conteúdo acabou vazada na internet. A obra “A sala onde aconteceu: um livro de memórias da Casa Branca (tradução livre)” descreve supostas más condutas de Trump no âmbito da política externa.


Mas durante discurso no local com apenas um terço da capacidade ocupada, Trump voltou a criticar a China, referindo-se ao coronavírus como “kung-flu”, e defendeu a gestão da Casa Branca no combate à pandemia. Segundo ele, a estratégia de “imunidade de rebanho” no enfrentamento da doença deixou países como Brasil e Suécia em uma situação ruim.


Ontem, o Brasil superou a marca de 50 mil mortes por Covid-19, pouco mais de três meses após o primeiro óbito, ocorrido na cidade de São Paulo. Da mesma forma, 90 dias desde o início da quarentena, o país registra mais de 1 milhão de casos. Esses números simbolizam a inépcia do país no enfrentamento da pandemia e põem o Brasil em segundo lugar na lista de casos e mortes por coronavírus, atrás apenas dos EUA.


BC e PMI na agenda


Já a agenda econômica desta semana traz como destaque no Brasil as publicações do Banco Central. Amanhã, a autoridade monetária publica a ata da reunião da semana passada, quando cortou o juro básico em mais 0,75 ponto e deixou a porta aberta para um ajuste “residual” na Selic no próximo encontro, em agosto, o que levaria a taxa para 2%.


Apesar dessa indicação do BC, os investidores irão procurar, no documento, pistas que possam apontar que o total de cortes já promovido, desde julho do ano passado, parece ser adequado aos impactos econômicos da pandemia. Evidências adicionais podem ser encontradas no Relatório de Inflação (RI) referente ao segundo trimestre deste ano.


O documento será divulgado na quinta-feira e será acompanhado de uma entrevista coletiva do presidente do BC, Roberto Campos Neto. Na ocasião, ele pode indicar o espaço adicional que a autoridade monetária vislumbra para estender o processo de afrouxamento, caso o dano na atividade seja maior que o esperado e não haja pressões cambiais.


Aliás, entre os indicadores econômicos, também merece atenção a prévia deste mês do índice de preços ao consumidor brasileiro (IPCA-15), que também sai na quinta-feira e deve confirmar o fim do período de deflação no varejo, após a recuperação dos combustíveis. Ainda assim, a inflação deve seguir comportada, diante do consumo retraído.


No exterior, o destaque fica com dados de atividade na zona do euro e nos EUA, amanhã. As prévias deste mês dos índices dos gerentes de compras (PMI) sobre o desempenho dos setores industrial e de serviços devem reforçar a percepção de intensa recessão econômica neste trimestre, aprofundando o ritmo de queda observado no início do ano.


Por isso, também merece atenção a terceira e última leitura do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA, na quinta-feira. No dia seguinte, saem dados sobre a renda pessoal e os gastos com consumo nos EUA em maio. Do outro lado do mundo, o Festival do Barco do Dragão (端午节) na China esvazia os negócios em Xangai e em Hong Kong no fim da semana.


Confira a seguir os principais destaques desta semana, dia a dia:

*Horários de Brasília

Segunda-feira: A semana começa com as tradicionais publicações domésticas do dia, a saber, o relatório de mercado Focus, do Banco Central (8h25), e os dados semanais da balança comercial (15h). Ainda por aqui, sai a prévia deste mês do índice de confiança da indústria (8h). No exterior, o calendário econômico está mais fraco, trazendo dados do setor imobiliário nos EUA (11h) e sobre a atividade na região de Chicago (9h30), além da leitura preliminar do índice de confiança do consumidor na zona do euro (11h).


Terça-feira: A ata da reunião de política monetária do Banco Central na semana passada é o destaque da agenda doméstica do dia. Lá fora, saem leituras preliminares de índices de atividade (PMI) dos setores industrial e de serviços na zona do euro e nos EUA.


Quarta-feira: O calendário doméstico perde força e traz apenas a sondagem sobre a confiança do consumidor e os dados do BC sobre o setor externo e o fluxo cambial. No exterior, a agenda também está mais fraca, trazendo somente os dados semanais sobre os estoques de petróleo bruto e derivados nos EUA.


Quinta-feira: O BC brasileiro volta à cena para divulgar o Relatório Trimestral de Inflação. Na sequência, o presidente da autoridade monetária concede entrevista coletiva à imprensa. Também por aqui, merece atenção a prévia deste mês do índice de preços ao consumidor (IPCA-15), além de dados sobre a construção civil. No exterior, as atenções se dividem entre a ata da reunião deste mês do Banco Central Europeu (BCE), a terceira e última leitura do PIB dos EUA no início deste ano e os pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos no país. Na China, um feriado mantém as bolsas de Hong Kong e de Xangai fechadas.


Sexta-feira: A semana chega ao fim trazendo, no Brasil, dados sobre a confiança do comércio neste mês e os números do BC sobre as operações de crédito. Nos EUA, saem dados sobre a renda pessoal e os gastos com consumo, além da versão revisada do índice de confiança do consumidor norte-americano.


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