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Mercado confia em perspectiva de melhora


A economia brasileira deve amargar hoje mais um resultado negativo. Mas isso não importa. O importante é que o mercado financeiro mostra confiança de que está em curso um cenário de recuperação - lenta e gradual - em 2017, apesar dos indicadores de atividade ainda fracos.

O Produto Interno Bruto (PIB) referente aos três últimos meses de 2016 deve ser o oitavo trimestre consecutivo de queda da economia, na maior sequência já registrada, cravando o segundo ano seguido de recessão do país – fato também inédito na série do IBGE – e evidenciando que pouca coisa mudou de fato no lado real da produção e do consumo.

A dúvida que fica é saber se o que se verá já foi ou irá se repetir. Por enquanto, o que se prevê é um recuo de 0,6% do PIB ao final de 2016, o que, se confirmado, seriado um ritmo menos intenso do que o observado no terceiro trimestre do ano passado (-0,8%).

Desse modo, o contágio para o desempenho da economia logo no início deste ano não deve ser tão ruim. Mesmo assim, investidores e economistas adiam para a segunda metade deste ano uma retomada mais sólida.

Até porque a abertura dos indicadores que compõem o PIB deve mostrar retração generalizada entre outubro e dezembro do ano passado, com a ótica da demanda refletindo a queda na renda e o alto desemprego e a ótica da oferta agonizando em níveis elevados de ociosidade. Nem mesmo a agronegócio deve escapar de um número negativo, acumulando queda em todos os quatro trimestres de 2016.

Os setores da indústria e de serviços também devem cair, refletindo investimento produtivo (FBCF) e consumo das famílias cada vez menores. Até mesmo as exportações e importações devem ter desempenho desfavorável, diante da valorização do real brasileiro e da atividade baixa.

Na comparação anual, a soma de todas as riquezas produzidas no país deve encolher pela décima primeira vez consecutiva (desde o segundo trimestre de 2014), em -2,4%, também em um ritmo de queda mais suave. Em meio a tantos números negativos, só resta ao PIB brasileiro cair no acumulado de 2016, em -3,5%, depois de tombar 3,8% em 2015, na mais longa recessão econômica que se tem registro.

Os números oficiais serão conhecidos às 9h. Mas, ainda que sejam melhores ou piores que o esperado, o mercado financeiro está interessado no que vem por aí e aposta no discurso oficial de que, daqui para frente, será diferente e tudo vai melhorar – por mais que os indicadores econômicos apontem para o outro lado, sem corroborar tais palavras animadoras.

Assim, as decisões do governo e a necessidade de avanço nas reformas e medidas macroeconômicas têm um peso importante em manter elevada essa expectativa de que “agora é diferente”. Até por isso, o presidente Michel Temer tenta se blindar do processo de cassação da chapa eleita em 2014, sob o argumento de que a queda do atual governo reverteria tais avanços.

A questão é que os números não corroboram essas premissas e, a cada conquista, o governo (e o mercado) quer mais. O principal alvo é o Banco Central, que vem sendo pressionado a acelerar o ritmo de queda da taxa básica de juros, diante da evolução favorável da inflação e da fragilidade da economia.

Ontem, porém, a autoridade monetária tratou de desfazer qualquer compromisso que poderia obrigá-la a aumentar o passo. Em nota, o BC mostrou-se preocupado com a precipitação do mercado em apostar em corte de um ponto percentual (pp) na Selic em abril. Para o BC, qualquer aceleração no ritmo prescreve uma "antecipação do ciclo".

Em outras palavras, se a magnitude de corte passar dos atuais 0,75pp para 1pp, o processo de redução da taxa de juros terminará antes do previsto - e não resultará em uma taxa ainda mais baixa. Assim, o BC parece sinalizar que já tem uma meta para a Selic no atual ciclo de distensão e esse nível está bastante atrelado a taxa de juros estrutural da economia.

Além do BC, as medidas de ajuste fiscal e estrutural também fazem parte do cenário de melhoria construído pelo mercado. Com a aprovação da emenda (PEC) que fixa um teto para os gastos públicos, a reforma da Previdência é o próximo bastião.

Também ontem, o presidente Michel Temer reuniu líderes da base aliada em um jantar e pediu aos deputados que mantenham "ao máximo" o texto da reforma da Previdência. Mas a proposta tem rejeição a alguns pontos polêmicos e já sofre os primeiros reveses, às vésperas da publicação da “lista de Janot”.

Os pedidos de abertura de inquérito, baseados em 77 delações premiadas de ex-executivos da Odebrecht, devem colocar na mira importantes membros do Executivo e do Legislativo. E isso tende a afetar a governabilidade de Temer, tanto no Palácio do Planalto (Jaburu) quanto no Congresso, respingando na confiança dos agentes econômicos.

Ainda na agenda econômica doméstica, o dia de divulgações começa com o IGP-DI de fevereiro (8h), que deve seguir em desaceleração. No mesmo horário do PIB (9h), sai o índice de preços ao produtor (IPP) em janeiro. Depois, serão divulgados os indicadores industriais da CNI (11h) e os números da Anfavea sobre o setor automotivo (11h20).

Já no exterior, logo cedo sai a leitura final do PIB da zona do euro ao final de 2016 e, no fim do dia, é a vez do crédito ao consumidor nos Estados Unidos. Tanto um dado quanto o outro tendem a calibrar as expectativas quanto à retirada de estímulos às economias norte-americana e europeia.

Essa percepção, aos poucos, vai fazendo os mercados internacionais caírem na real. A sinalização do Federal Reserve de que deverá elevar a taxa de juros nos EUA novamente na reunião marcada para a semana que vem retrai os negócios com risco no exterior, ao mesmo tempo em que fortalece o dólar ante os rivais e eleva o rendimento (yield) dos títulos norte-americanos.

O juro projetado pela T-note de 10 anos já supera os 2,5%. Nas bolsas, os índices futuros de Nova York estão em queda, contaminando a abertura do pregão na Europa, após um desempenho misto nas praças asiáticas. Nas commodities, os metais básicos seguem em queda diante dos desafios na China em relação ao crescimento econômico, ao passo que o petróleo tenta defender a marca de US$ 53 o barril.

Como pano de fundo para esse desempenho têm-se também a previsão do JPMorgan de que a retórica mais dura ("hawkish") dos integrantes do Fed deve levar a uma realização de lucros no curto prazo em Wall Street, depois da sequência de recordes cravados pelo Dow Jones e S&P 500. A eleição presidencial na França, Alemanha e Holanda deprime o euro, além dos planos do Deutsche Bank em levantar capital, que pesam nas bolsas da região.

Nesse ambiente, a confiança dos mercados financeiros na melhora da economia global tende a ser testada e os investidores tendem a reduzir a exposição aos ativos de risco, percebendo que o buraco para os negócios é político.

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