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Política ditou rumo dos mercados no Brasil e relegou exterior


A aposta de que a presidente Dilma Rousseff “vai cair” levou o dólar para baixo de R$ 3,60, na menor cotação desde agosto, e a Bovespa ao maior nível desde julho, reavendo a faixa dos 50 mil pontos pela primeira vez no ano. O movimento foi capitaneado pelo fluxo especulativo dos investidores estrangeiros que, na mesma velocidade que vêm, vão. Afinal, março se encerra com o cenário político ainda indefinido e sujeito a ajustes.

Com o fim de mês especialmente ruim para o PT e o governo, o engajamento da população brasileira foi um fator a mais de pressão. O mercado ouviu a voz das ruas, quando milhões de pessoas – a maioria com perfil branco e elitizado, sobretudo na capital paulista – protestaram no dia 13, o que elevou as chances de isolamento de Dilma, ampliadas com a ruptura oficial do apoio do PMDB.

A convulsão social aumentou quando o juiz da Operação Lava Jato, Sérgio Moro, em uma decisão polêmica, divulgou à maior rede nacional de televisão do país uma conversa entre Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, grampeada pela Polícia Federal em horário após a decisão do próprio magistrado de ordenar pela interrupção da escuta telefônica. Para Moro, o horário do “grampo” não é relevante.

Tampouco, talvez, a lei de interceptação telefônica, de 1996, que obriga o juiz a manter as escutas em sigilo e remetê-las diretamente ao Supremo Tribunal Federal (STF), levando-se em conta a prerrogativa da presidente da República, cargo que tem foro privilegiado por prerrogativa na Constituição. Apenas cinco dias após a divulgação da conversa pela TV, Moro enviou ao STF os “grampos”.

O material foi, então, colocado sob sigilo por decisão do ministro da Corte Teori Zavascki, que determinou ainda que o juiz do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), no Paraná, desse explicações sobre a divulgação dos áudios, em um prazo de até dez dias. Como resposta, Moro pediu “respeitosas escusas” diante da controvérsia decorrente de vazamento ilegal e afirmou que “jamais” teve a intenção de provocar polêmicas, conflitos ou constrangimentos.

Já a decisão de Teori de suspender as investigações da Lava Jato sobre Lula foi chancelada pela maioria dos ministros do STF. Com a decisão, a parte da investigação que envolve o ex-presidente continuará sob responsabilidade da Corte, e não poderá ser conduzida por Moro. Seguiram o relator, os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.

Os mercados domésticos operaram em meio a essa judicialização da política, independentemente da legalidade ou não dos fatos e ignorando os gritos em favor da democracia, que aconteceram em todos os Estados brasileiros quatro dias após os atos anti-Dilma e foram repetidos, em maior número, no último dia do mês. Os investidores calibraram as expectativas, precificando nos ativos um cenário-base de saída de Dilma e se preparando para um governo de transição, com a posse do vice, Michel Temer.

Ele, aliás, segue no cargo, apesar da decisão do PMDB de sair da base aliada do governo. A decisão foi aprovada por aclamação em um encontro que durou menos de quatro minutos, sem nenhum explicação a mais após longos 13 anos ao lado do PT. Fico definido que nenhum integrante da legenda está autorizado a exercer cargos no governo em nome do partido, sob pena de processo ético - exceto Temer.

Nessa disputa pelo poder, não se pode esquecer a “superplanilha” da Odebrecht, que não poupou quase nenhum político que está no centro das atenções da atual crise que assola o país – à exceção de Lula e Dilma. A lista tem nomes ligados a siglas da base aliada e da oposição, deixando a sensação entre os políticos de que “somos todos corruptos”.

Além disso, a delação premiada do ex-presidente do conglomerado Marcelo Odebrecht pode apontar para o uso ilegal de recursos na campanha eleitoral de 2014, o que também atingiria o vice-presidente, Michel Temer, que seguiu no cargo, apesar da debandada do partido da base aliada. Os nomes de Aécio Neves e Eduardo Campos também estão no documento da empreiteira.

Com a chapa eleita impugnada e o segundo colocado envolvido em esquemas de propina, o Brasil entraria em um vazio institucional perigoso. Afinal, quem talvez poderia assumir o poder, ainda que interinamente, até a convocação de novas eleições, seria o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha - primeiro parlamentar no exercício de mandato a torna-se réu na Lava Jato e que também está na lista da Odebrecht.

Aliás, os advogados dele apresentaram a defesa ao Conselho de Ética, o que dá continuidade ao processo que pode cassar o mandato do deputado. Mas as manobras de Cunha continuam...

Outro processo em tramitação na Câmara é o impeachment de Dilma, que se baseia em um suposto crime de responsabilidade por causa de manobras fiscais - as chamadas “pedaladas fiscais”, e que deve adentrar ao longo do mês de abril, apesar do ritmo intenso de realização das sessões da comissão especial.

Arrolado como testemunha de defesa, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou que o pedido de impeachment não tem base legal, pois os decretos e pagamentos feitos pelo governo atenderam à legislação vigente na época em que ocorreram. Segundo ele, não há o que se falar de irresponsabilidade fiscal, ou de crime de responsabilidade fiscal, “no momento em que se faz o maior contingenciamento da história”.

Dos 65 membros da comissão, um terço responde a processos de corrupção no STF e 40 receberam dinheiro de empresas investigadas pela Lava Jato. Mesmo assim, Dilma diz ter convicção de que terá os votos necessários para barrar o processo de impeachment que tramita contra ela.

Na próxima segunda-feira, Dilma deve apresentar sua defesa contra o processo de perda de mandato na Casa. A estratégia do Palácio do Planalto é de dar mais espaço aos partidos menores da base aliada, o chamado "novo centrão", como forma de garantir os 172 votos necessários para barrar o impeachment na Câmara. Um novo ministério deve ser formado o quanto antes.

O esquema de corrupção também continua causando estragos na Petrobras. A estatal petrolífera reportou um prejuízo recorde de R$ 35 bilhões em 2015, devido às baixas contábeis (impairments) no valor dos ativos. Somadas, as perdas nos dois últimos anos chegam a R$ 100 bilhões.

Enquanto isso, no exterior, o Federal Reserve veio com palavras suaves (“dovish”) ao final da reunião de março e, depois, na boca da comandante do Fed, Janet Yellen. Primeiro, o Banco Central dos Estados Unidos sinalizou que devem ocorrem apenas dois novos aumentos de juros em 2016 – e não mais quatro. A presidente da autoridade monetária emendou, depois, dizendo que essa projeção não é um “plano” e depende da evolução da economia, doméstica e internacional.

Essa postura alimentou o apetite por risco, o que levou os índices Dow Jones e S&P 500 a acumulares ganhos em 2016, após o pior início de ano na história dos mercados financeiros. A estabilização dos preços do barril de petróleo na faixa de US$ 40 também foi responsável por essa melhora em Wall Street, melhorando o humor dos investidores pelo mundo.

Já a segunda maior economia do mundo segue como um ponto de interrogação. Os dados combinados de janeiro e fevereiro sobre a atividade chinesa mostraram uma contínua desaceleração da indústria, que registrou o início de ano mais fraco desde 2009, enquanto o varejo continuou crescendo acima de dois dígitos, mas com fôlego mais curto. No comércio exterior, as exportações da China aos principais parceiros – EUA, Brasil, Alemanha, Japão etc. – caíram em mais de 20% no período, enquanto as importações recuaram mais que o previsto.

Apesar de serem distorcidos pelas festividades do Ano Novo Lunar, os números elevaram a pressão sobre Pequim para alcançar o alvo de crescimento até 2020, entre 6,5% e 7% ao ano, diante do baixo crescimento global e da demanda fraca. Porém, durante a reunião de líderes políticos em Pequim nas “duas sessões” (两会) foi definido que grandes estímulos ao país não são necessários.

Ainda assim, é preciso dar prosseguimento às reformas por lá - e também por aqui, pois chega uma hora que o sistema em curso exige tais mudanças, mesmo passadas várias décadas.

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